Elefante Branco


— Eu te amo - disse ele ao meu ouvido antes de soltar minha mão e correr para seu ônibus.
A minha reação foi de completa alegria e medo. Não pude dizer o que sentia, mesmo que por um momento. Abdiquei de dizer o que queria ter dito. Como no filme Efeito Borboleta, eu teria feito diferente? Talvez. Não sei quais são os desígnios que a vida tem pra gente. Tudo pode acontecer. Mas eu sabia que em algum momento eu ia me arrepender de não ter proferido as palavras em retorno.
Palavras são como feitiços, a mais primitiva e analógica forma de se expressar pelo som tem o poder de mover multidões. E naquele dia você me enfeitiçou. Pra ser mais honesto, eu já estava enfeitiçado. Eu te amei desde o dia em que te vi pela primeira vez.
A caminhada, o mar, a brisa, o luar. Foi como se o mundo tivesse finalmente orquestrado um momento perfeito para uma pessoa perfeita.
Como se dissese: — Você esperou muito por esse dia, agora ele será seu.
E eu acreditei. Acreditei com todas as minhas forças que você seria a luz que eu precisava.
Mas algo me incomodava. Nosso amor nasceu nas trevas, mesmo sendo luz. E a natureza dessa relação me tirava de órbita.
Eu te convidei pra minha casa, mas ao abrir o quarto você notou que lá existiam outros inquilinos, demônios. Estes dos quais você não pode lidar. E quer saber, tudo bem. Não é como se a vida não pregasse peças na gente. Não é todo mundo que se dispõe de se relacionar com um brinquedo quebrado.
Você me colocou no porão, trancou a porta e jogou a chave. Um telefonema. Por um telefonema. Nem raiva consegui sentir. Seria em vão. Só me apeguei à ideia de que você poderia estar sofrendo do outro lado da porta, mesmo que distante.
Na rua, no meu cotidiano, meu coração ardia ao passar por essa cidade fantasma. Repleta de memórias. O bar que frequentávamos, o canto onde esperava a aula começar, o banco em que deitei no teu colo para olhar o céu noturno.
Você me disse "eu te amo" e acreditei, acreditei com todas as minhas forças que não me esforcei pra fingir o que não sentia. E a verdade do que sinto e do que sempre vou sentir é que aqui dentro tem um oceano vivo e profundo, crescendo a cada dia. Minha intenção não foi te afogar nele.
Por muito tempo eu velei o túmulo de um relacionamento com o caixão vazio. Não pude te ver. Minha única ressalva foi que eu te amei com tudo o que tinha.
Te amei mais que a mim estranho. Mais que a mim.
